A chegada do medicamento Kisunla, novo tratamento contra alzheimer, ao Brasil representa um avanço muito aguardado no combate à doença que ainda desafia a medicina moderna. Em abril de 2025, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou o uso do Kisunla no país, colocando o Brasil entre as nações que oferecem tratamentos inovadores para essa condição.
Desenvolvido pela farmacêutica Eli Lilly, o Kisunla (nome comercial do princípio ativo donanemabe), ao contrário dos medicamentos tradicionais, que focam apenas nos sintomas, ele busca retardar a progressão da doença, oferecendo aos pacientes uma chance de manter a autonomia por mais tempo.
Tal aprovação foi baseada em estudos clínicos de grande porte, como o TRAILBLAZER-ALZ 2, que mostraram resultados animadores. Agora, com sua liberação no Brasil, abre-se uma nova oportunidade para milhares de famílias que convivem com os impactos devastadores da doença.
O que é o Alzheimer e por que seu tratamento é tão desafiador?
Alzheimer é um tipo de demência progressiva, que afeta principalmente pessoas com mais de 65 anos, embora também possa surgir antes disso em alguns casos. Trata-se de uma condição que deteriora lentamente as células cerebrais, afetando a memória, o pensamento e o comportamento.
Essa degeneração ocorre, em grande parte, devido ao acúmulo anormal de proteínas no cérebro — especialmente a beta-amiloide e a tau. As placas formadas por beta-amiloide interferem na comunicação entre os neurônios e acabam levando à morte dessas células.
Por isso, as funções cognitivas vão se perdendo ao longo do tempo. Nos estágios mais avançados, o paciente pode ter dificuldades até mesmo para reconhecer familiares ou realizar tarefas básicas.
Durante décadas, os tratamentos disponíveis ofereciam apenas um alívio temporário dos sintomas. Nenhum deles era capaz de interferir de fato nos processos biológicos que causam a doença. O surgimento de medicamentos como o Kisunla muda esse cenário.
Como o Kisunla age no organismo?
Kisunla atua de forma bastante inovadora. Ele é um anticorpo monoclonal, ou seja, um tipo de proteína desenvolvida em laboratório para identificar e atacar um alvo específico — no caso, as placas de beta-amiloide que se acumulam no cérebro de pessoas com Alzheimer.
Quando administrado, o medicamento se liga a essas placas, ajudando o sistema imunológico a reconhecê-las como algo que deve ser eliminado. Isso promove uma espécie de “faxina” cerebral, reduzindo a quantidade dessas placas nocivas.
Com menos placas de beta-amiloide, os neurônios conseguem funcionar de forma mais eficiente por mais tempo. Embora o medicamento não seja uma cura, ele retarda o avanço da doença, permitindo que os pacientes mantenham suas habilidades cognitivas e motoras por um período maior.
Essa abordagem é resultado de anos de pesquisa. O estudo TRAILBLAZER-ALZ 2, que envolveu mais de 1.700 participantes, mostrou que o Kisunla foi capaz de reduzir em até 35% o ritmo de deterioração cognitiva e funcional em comparação com um placebo.
Os resultados foram tão consistentes que o medicamento obteve aprovação tanto pelo FDA (nos Estados Unidos) quanto pela Anvisa no Brasil.
Para quem o Kisunla é indicado?
Um ponto importante é que o Kisunla não é recomendado para todos os pacientes com Alzheimer. Ele é indicado especificamente para pessoas que estão nos estágios iniciais da doença, quando ainda possuem uma boa reserva cognitiva e conseguem desempenhar atividades do dia a dia com algum grau de independência.
Além disso, o tratamento só faz sentido em casos em que o paciente apresenta um acúmulo confirmado de placas de beta-amiloide. Isso é verificado por meio de exames de imagem específicos, como o PET scan, ou análise de líquor.
Portanto, antes de prescrever o medicamento, o neurologista deverá realizar uma avaliação detalhada. O objetivo é garantir que o paciente realmente se encaixa no perfil que mais pode se beneficiar com o tratamento.
Como o medicamento é administrado?
O Kisunla não é um comprimido comum. Seu uso é feito por meio de infusão intravenosa, ou seja, o paciente recebe o medicamento diretamente na veia, em um ambiente controlado — geralmente uma clínica especializada ou hospital.
A aplicação ocorre em um esquema de uma infusão por mês. A duração do tratamento varia de acordo com a resposta individual de cada paciente, mas, nos estudos clínicos, foi observado que após 12 a 18 meses de uso já se obtém uma redução significativa das placas no cérebro.
Durante o tratamento, o paciente passa por monitoramento constante, incluindo ressonâncias magnéticas periódicas, para detectar possíveis efeitos adversos.
Quais são os possíveis efeitos colaterais?
Como qualquer medicamento inovador, o Kisunla também apresenta riscos que devem ser considerados. O principal deles está relacionado a um fenômeno conhecido como ARIA (Anomalias Relacionadas ao Amiloide), que consiste em pequenas alterações no cérebro, como edema (inchaço) ou micro-hemorragias.
Embora, na maioria dos casos, essas alterações sejam transitórias e não causem sintomas graves, é essencial o acompanhamento por uma equipe médica especializada. Além do ARIA, outros efeitos adversos relatados incluem dor de cabeça, tontura, náuseas e, em casos isolados, confusão mental.
Por isso, o uso do Kisunla exige um controle rigoroso e não deve ser iniciado sem uma avaliação médica cuidadosa.
O medicamento já está disponível no Brasil?
Com a recente aprovação da Anvisa, o Kisunla já pode ser comercializado no Brasil, mas sua disponibilidade prática nas redes pública e privada ainda depende de alguns processos adicionais, como a definição do preço pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e acordos com os sistemas de saúde.
Além disso, por se tratar de um medicamento de alto custo e que requer administração especializada, é provável que, inicialmente, ele esteja disponível em centros médicos de referência.
O medicamento deve ser armazenado sob refrigeração entre 2°C e 8°C, e sua preparação deve seguir os protocolos estabelecidos para garantir sua eficácia.
Uma nova esperança para pacientes e famílias
Essa chegada do Kisunla, novo tratamento contra alzheimer, representa um marco importante na luta contra a doença. Pela primeira vez, pacientes brasileiros terão acesso a um tratamento que não apenas ameniza os sintomas, mas atua de forma mais direta na causa da doença.
Embora não seja uma cura, o Kisunla oferece a possibilidade de prolongar a qualidade de vida e a autonomia dos pacientes nos estágios iniciais da doença. Isso significa mais tempo para viver experiências significativas com familiares e amigos — algo que, para quem enfrenta o Alzheimer, não tem preço.
Com o avanço contínuo das pesquisas, é possível que, no futuro, surjam tratamentos ainda mais eficazes. Mas, por ora, o Kisunla já é uma conquista importante, e sua aprovação no Brasil traz uma dose real de esperança para quem vive com Alzheimer e para toda a sociedade.
Fontes:
Anvisa;
Eli Lilly;
FDA;
Medscape;
CNN Brasil;
Uol.